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Direito Internacional Espacial: O Papel do Acordo Ártemis

Foto do escritor: Thaís Peixoto Saraiva CoimbraThaís Peixoto Saraiva Coimbra

Introdução


O Direito Internacional Espacial tem evoluído de forma significativa desde a assinatura do Tratado do Espaço Sideral em 1967. Com a crescente participação do setor privado e o aumento do interesse por exploração lunar, novos acordos internacionais surgiram para regulamentar essas atividades. O Acordo Ártemis, promovido pelos Estados Unidos em 2020, destaca-se como um marco na cooperação internacional para a exploração espacial pacífica.


O Acordo Ártemis e Seus Princípios Fundamentais


O Acordo Ártemis estabelece um conjunto abrangente de princípios destinados a reger a exploração pacífica e sustentável do espaço, com foco especial na Lua, Marte e outros corpos celestes. Esse acordo foi criado como um desdobramento do Tratado do Espaço Exterior de 1967, estabelecendo diretrizes modernas para as atividades espaciais do século XXI. Seus signatários comprometem-se a seguir princípios fundamentais, incluindo o uso exclusivamente pacífico do espaço, a transparência nas operações e a cooperação internacional para evitar conflitos e promover o desenvolvimento sustentável. Além disso, o acordo enfatiza a necessidade de interoperabilidade entre os sistemas espaciais de diferentes países, garantindo que as missões possam operar de forma conjunta e eficiente.


Outro ponto central do Acordo Ártemis é o compromisso com a sustentabilidade, especialmente no que se refere à utilização de recursos espaciais. Isso inclui diretrizes sobre extração e uso de materiais da Lua e asteroides, estabelecendo um marco para atividades que, no futuro, poderão impulsionar a colonização espacial. Os signatários também assumem compromissos relacionados à assistência emergencial em caso de necessidade, ao registro e rastreamento de objetos espaciais para evitar interferências, à preservação do patrimônio histórico lunar e à mitigação de detritos orbitais, um problema crescente que pode comprometer futuras missões. Dessa forma, o Acordo Ártemis não apenas estabelece normas para a exploração espacial, mas também visa garantir que essas atividades sejam conduzidas de maneira responsável e benéfica para toda a humanidade.


Impacto no Direito Internacional Espacial


O impacto do Acordo Ártemis no Direito Internacional Espacial tem sido um tema amplamente debatido na comunidade jurídica e científica. Embora esteja fundamentado no arcabouço de Tratados já existentes, ele introduz diretrizes mais específicas para a exploração de recursos lunares e a coordenação entre nações, o que gera desafios para a interpretação do antigo Tratado do Espaço Exterior. Um dos principais pontos de discussão é a forma como o Acordo trata a utilização de recursos espaciais, já que o Tratado de 1967 proíbe a apropriação nacional de corpos celestes, algo que poderia abrir precedentes para uma corrida espacial sem um consenso global.


Outro aspecto controverso é que o Acordo Ártemis não foi negociado no âmbito das Nações Unidas, mas sim promovido pelos Estados Unidos como uma iniciativa bilateral e multilateral com países parceiros. Isso levanta preocupações sobre uma possível governança espacial liderada por interesses nacionais específicos, em detrimento de um modelo mais inclusivo e regulado internacionalmente. No entanto, tal fato representa um avanço necessário para garantir maior segurança jurídica nas atividades espaciais e promover um ambiente previsível para as missões de exploração. Além disso, o fato de contar com um número crescente de signatários demonstra a aceitação global de seus princípios e a disposição das nações em cooperar para o desenvolvimento sustentável do espaço.


Ao criar padrões claros para a exploração lunar e cislunar, o Acordo Ártemis contribui para um cenário mais estruturado, no qual a exploração espacial é conduzida de maneira responsável e coordenada. Seu impacto no Direito Internacional Espacial ainda está em evolução, mas sua existência já influencia debates sobre a necessidade de novas regulamentações e de um modelo de governança global mais robusto para o futuro da exploração além da Terra.


Expansão dos Acordos Ártemis e Seus Princípios


Desde sua criação, os Acordos Ártemis vêm atraindo um número crescente de signatários. Em janeiro de 2025, já contavam com 53 países, evidenciando o crescente apoio à visão de uma exploração espacial pacífica e cooperativa. Esses princípios, fundamentados no Tratado do Espaço Exterior de 1967, estabelecem um entendimento comum sobre práticas responsáveis no espaço. A importância da interoperabilidade e da transparência é reiterada para garantir que as missões sejam seguras e eficazes. O compromisso com a assistência emergencial reforça a necessidade de uma abordagem solidária entre as nações em casos de risco no espaço. Além disso, o registro de objetos espaciais e a divulgação de dados científicos são essenciais para um ambiente espacial previsível e sustentável.


Outro ponto relevante é a proteção do patrimônio espacial, reconhecendo a importância histórica dos locais de pouso e artefatos espaciais. A regulamentação da utilização de recursos espaciais também ganha destaque, visto que a extração e o aproveitamento desses recursos devem ser conduzidos em conformidade com o direito internacional, beneficiando toda a humanidade. A mitigação de conflitos e a criação de zonas de segurança para evitar interferências prejudiciais são aspectos centrais dos Acordos, assim como a necessidade de práticas responsáveis na eliminação de detritos espaciais. Esses elementos garantem que a exploração espacial ocorra de forma sustentável e cooperativa.


O Brasil e os Acordos Ártemis


O Brasil aderiu aos Acordos Ártemis em 2021, reforçando seu compromisso com a exploração espacial sustentável e cooperativa. O presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), Marco Antonio Chamon, no Fórum SpaceBR Show 2024, enfatizou que a adesão do Brasil não implica a obrigação de executar missões específicas, mas sim de seguir os princípios de transparência, sustentabilidade e cooperação estabelecidos nos acordos.


A inserção do Brasil nos Acordos Ártemis também abre oportunidades para a ciência nacional. A divulgação de dados científicos gerados por missões internacionais é um dos aspectos mais celebrados, pois permite que pesquisadores brasileiros tenham acesso a informações de ponta para o desenvolvimento de novas tecnologias e estudos espaciais. Além disso, a participação brasileira no programa fortalece o setor aeroespacial nacional e amplia a cooperação internacional.


Um dos destaques da presença do Brasil nos Acordos Ártemis é a contribuição do país para a pesquisa em agricultura espacial. O Brasil é reconhecido como uma potência agrícola e tem investido na pesquisa de cultivos adaptáveis ao ambiente espacial. Especialistas da Embrapa e da Rede Space Farming Brasil estão explorando técnicas de cultivo que possam ser aplicadas em missões de longa duração na Lua e Marte, garantindo sustentabilidade alimentar para futuras colônias espaciais.


Outro projeto promissor é a Missão SelenITA, liderada por pesquisadores do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Essa missão visa investigar a dinâmica lunar e avaliar riscos para futuras operações na Lua. Com o desenvolvimento de um cubesat para monitoramento e exploração, a participação brasileira se insere diretamente no avanço científico e tecnológico da exploração espacial.


O Brasil também enfrenta desafios no setor espacial, incluindo a necessidade de maior investimento em infraestrutura e tecnologia. No entanto, a inclusão do país nos Acordos Ártemis dentro do Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE 2022-2031) sinaliza um compromisso estratégico de longo prazo. A adesão aos princípios do acordo não apenas fortalece a posição do Brasil no cenário internacional, mas também incentiva a inovação científica e tecnológica em território nacional.


Desafios e Perspectivas Futuras


A adoção do Acordo Ártemis levanta questões sobre o futuro da governança espacial. Entre os desafios estão a inclusão global, pois o Acordo ainda não conta com a adesão de todas as grandes potências espaciais, como China e Rússia; a regulamentação da exploração de recursos, visto que a falta de um consenso global sobre a utilização de recursos espaciais pode gerar disputas futuras; e a harmonização com tratados existentes, pois o alinhamento do Acordo Ártemis com tratados internacionais precisa ser esclarecido para evitar conflitos jurídicos. Diante desses desafios, é possível que novas negociações internacionais sejam necessárias para estabelecer regras mais inclusivas e amplamente aceitas. O papel das Nações Unidas e do Comitê das Nações Unidas para o Uso Pacífico do Espaço Exterior (COPUOS) será fundamental nesse processo.


Conclusão


Os Acordos Ártemis representam um passo importante na regulação da exploração espacial, trazendo diretrizes que visam garantir a sustentabilidade e a cooperação internacional. Sua crescente aceitação entre os países demonstra um esforço global para fortalecer a governança espacial. No entanto, sua implementação levanta questões sobre inclusão global e compatibilidade com o Direito Internacional Espacial vigente. O futuro da governança espacial dependerá do diálogo entre as nações e da busca por um consenso sobre as regras de exploração e uso dos recursos espaciais. Os Estados Unidos continuam a incentivar a adesão de novos países aos Acordos Ártemis, buscando consolidar um modelo de cooperação que permita a exploração segura e sustentável do espaço para benefício de toda a humanidade.


Referências


ESTADOS UNIDOS. Acordos Artemis: Unidos pela Exploração Pacífica do Espaço Profundo. Washington, D.C.: Embaixada e Consulados dos EUA no Brasil, 2020. Disponível em: https://br.usembassy.gov/wp-content/uploads/sites/32/artemis-pt-1.pdf. Acesso em: 28 fev. 2025.


ESTADOS UNIDOS. Artemis Accords. Bureau of Oceans and International Environmental and Scientific Affairs, 2024. Disponível em: https://www.state.gov/bureau-of-oceans-and-international-environmental-and-scientific-affairs/artemis-accords. Acesso em: 28 fev. 2025.

MUNDOGEO. Projeto Artemis: entenda o papel do Brasil na Lua. MundoGEO, 28 jun. 2024. Disponível em: https://mundogeo.com/2024/06/28/projeto-artemis-entenda-o-papel-do-brasil-na-lua/. Acesso em: 28 fev. 2025.


AGÊNCIA ESPACIAL BRASILEIRA. Aniversário do Acordo Artemis. Governo do Brasil, 2022. Disponível em: https://www.gov.br/aeb/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/instagram-do-periodo-de-defeso-eleitoral-2022/aniversario-acordo-artemis. Acesso em: 28 fev. 2025.



NAÇÕES UNIDAS. Treaty on Principles Governing the Activities of States in the Exploration and Use of Outer Space, including the Moon and Other Celestial Bodies (Outer Space Treaty). Escritório das Nações Unidas para Assuntos do Espaço Exterior (UNOOSA), 1967. Disponível em: https://www.unoosa.org/oosa/en/ourwork/spacelaw/treaties/outerspacetreaty.html. Acesso em: 28 fev. 2025.


Autora do texto:


Thaís Peixoto Saraiva Coimbra é natural de Belo Horizonte/MG. Pesquisadora do Centro de Direito Internacional, Advogada Internacionalista na Amorim Global, (OAB/MG 231.338), Bacharel em Direito pela Dom Helder Escola Superior, e em Ciências do Estado pela Universidade Federal de Minas Gerais. Além de Pós-Graduada em Direito Internacional pelo CEDIN.

 
 

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