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Foto do escritorMaria Eduarda Diniz

A pouca representação de mulheres na Diplomacia Brasileira

Os direitos das mulheres, como se sabe, demoraram a ser incorporados como direitos humanos. Igualdade foi incorporada como parte do vocabulário das democracias ocidentais no século XVIII, porém, sua plenitude é até hoje uma questão complicada. Basta observar a Revolução Francesa, que trouxe ideias revolucionárias para a época de uma igualdade entre os homens e que não fosse permitida a violência do estado sobre a população.


Porém, as mulheres ficaram muito tempo fora dessa equação. Em 1791, uma mulher tentou reinvindicar o sufrágio para as mulheres assim como para os homens. Olympe de Gouges defendeu uma Declaração dos direitos da mulher e cidadã, como uma resposta a declaração proposta pelos homens, porém, como esses eram a esmagadora maioria na política, essas ideias não foram levadas a sério.


Muitas mulheres tentaram, depois dela, garantir maior participação feminina na política e garantir direitos mínimos às mulheres. A violência contra a mulher se mostra em diferentes formas, mas foi só a partir do século XX que ela foi normatizada. Com a intervenção de Eleanor Roosevelt, a Declaração Universal dos Direitos Humanos elencou que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”, portanto não podendo mais ser desfeitas de proteção internacional os direitos das mulheres.


Apesar dos avanços ao longo das décadas, existem espaços que são difíceis para a ascensão feminina. E um espaço hierárquico difícil ainda de trespassar é o Diplomático. Em 1986, Joan Scott, junto com outras autoras feministas das Relações Internacionais, apontou que a história política é encenada no terreno do gênero. Temas como a guerra, a diplomacia e a política externa foram construídos a partir de relações de poder entre o feminino e o masculino, estabelecendo a sua existência e autoridade a partir da exclusão de mulheres do funcionamento político e diplomático.


A presença de mulheres nos altos cargos do Serviço Exterior Brasileiro demonstra uma série de disparidades entre os gêneros. Em 2020, por exemplo, segundo dados oficiais, dos 122 chefes de embaixada do país, apenas 12 eram mulheres. Na época das eleições de 2022, foram feitas promessas pelo então candidato, o atual presidente Lula, de trabalhar com mais mulheres em posições superiores no Ministério das Relações Exteriores. Contudo, a Associação de Mulheres Diplomatas do Itamaraty apontou falhas nesse sentido, visto que, na primeira lista de nomes dos chefes das embaixadas mais importantes do país continuaram sendo de maioria masculina—com apenas uma indicação feminina.


Analisando a história, no Brasil, em 1918, Maria José de Castro Rebello Mendes foi a primeira colocada em concurso de ingresso no quadro de oficiais da Secretaria de Estado das Relações Exteriores. Sua admissão foi contestada pelas autoridades da época, mas a defesa de Rui Barbosa garantiu seu assento no Instituto Rio Branco. Tratava-se da primeira mulher a ingressar no corpo diplomático brasileiro, inspirou o ingresso de outras mulheres na carreira diplomática, a exemplo de Beata Vettori, Dora Vasconcellos e Odette de Carvalho e Souza, primeira embaixadora brasileira, que chefiou de 1956 a 1959 o então Departamento Político do Ministério das Relações Exteriores.


Contudo, segundo dados do Instituto Rio Branco, a média histórica de acesso de mulheres à carreira diplomática está no patamar de 20%. Atualmente, o número de mulheres em atividade na carreira diplomática é de 364, de um total de 1.588 diplomatas, o que representa aproximadamente 22,9% do efetivo. Entre as mulheres em atividade, 37 pertencem à classe de ministra de primeira classe (18,6% de um total de 199 embaixadores), e 36 exercem a chefia de embaixadas, consulados e representações do Brasil mundo afora (15,9% de um total de 227 postos). Esses números demonstram a disparidade não só no Corpo Diplomático, como também são um espelho da participação de mulheres no funcionalismo público brasileiro.


As políticas públicas relacionadas a gênero dependem necessariamente da presença de mulheres no setor público. Isso não é diferente no caso de acordos comerciais e regionais. Os governos têm um papel crítico na liderança deste tema, o que requer a promoção da igualdade de gênero em todas as esferas do processo de tomada de decisão. O Brasil é um dos países latino-americanos com maior déficit de representação feminina nos altos escalões do serviço exterior, tem um impacto profundo na política externa brasileira como um todo (A Guatemala é o único outro país da América Latina onde a participação feminina em cargos públicos fica abaixo de 20%.)


Ter mulheres à mesa durante as negociações comerciais é de fundamental importância para todos os países. Hoje, as missões diplomáticas da Alemanha e do Canadá seguem uma política de paridade de gênero. O Reino Unido nomeou apenas mulheres para chefiar suas embaixadas nos países membros do Conselho de Segurança da ONU. O serviço estrangeiro francês é abertamente feminista, com um alto comissário para a igualdade e plena paridade de gênero, tanto em cargos internos quanto em missões diplomáticas no exterior.

Será que poderemos ver o mesmo no Brasil, em breve? A igualdade de gênero é essencialmente uma questão de direito humano, sendo necessária a construção de um caminho rumo à paridade de participação nos espaços de poder, pois as mulheres devem ser tão livres quanto os homens na busca de uma carreira com perspectivas justas e dignas a ambos os gêneros.


Referências

ALBAINE, Laura et al. Deshilando las violencias de género y construyendo centros de resistencias. 2016.

ARRUDA, Bráz de Souza. A mulher na Diplomacia. Revista da Faculdade de Direito de São Paulo, São Paulo, v. 4, 1931 p. 229-243.

BALESTERO, Gabriela Soares. Mulheres na Diplomacia Brasileira. Rev. Fac. Dir. Uberlândia, MG, 2017.

Brasil. Ministério das Relações Exteriores. Instituto Rio Branco. Anuário do Instituto Branco / Ministério das Relações Exteriores. Brasília: Instituto Rio Branco, 2016.

DANESE, Paula Monteiro. Igualdade de Gênero e Acesso a Justiça: O que mudou desde a declaração universal dos Direitos Humanos? In: ARRUDA, Eloisa de Sousa; PEREIRA, Flávio de Leão B. 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. ESMP, 2021.

ELSHTAIN, Jean Bethke. Public Man, Private Woman: Women in Social and Political Thought - Second Edition. 1981.

ELSHTAIN, Jean Bethke. Women and War. University of Chicago Press, 1991.

PRÁ, Jussara Reis. Cidadania de gênero, democracia paritária e inclusão política das mulheres. Gênero na Amazônia. Belém, n. 4, jul-dez 2013.

SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil para análise histórica. Tradução: Christiane Rufino Dabat e Maria Betânia Ávila. 1990



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